sexta-feira, 27 de dezembro de 2024

Tempero mental


Tempero mental 

Não há necessidade 

De pimenta ou sal

O saber é o sabor da idade 

Agridocemente individual 


No interior da cavidade 

Humor temperamental

Só gargalha quem sabe 

Não se finge felicidade 

Tão-somente para as fotos 


O futuro, com saudades,

Saúda os terremotos

Funda minhas cidades 

Afunda os maus modos

E finda meus disfarces 


Boiando como corpos

Em marcha, sem charme 

Soldados mortos

Ninguém se define pela metade

Tampouco por rótulos 


Perdi a quantidade 

De vazios, de vezes

Em que cometi estupidezes

No cair da tarde quente 

Quando a gente vira ente 


Eu me perdi na velocidade 

Das vozes, das vezes 

Em que menti aos deuses

Tomado por qualquer vontade 

Em que me demiti por meses 


Trocando fés por fezes

Supondo ser a outra margem  

Num dia inédito desses 

Sem coragem, eu não existiria 

Sem as minhas repetições


Sem as recordações 

Eu não reconheceria

A ordem das canções

Sou habitado por uma nostalgia 

Desprovida de compreensão 


É um sintoma de haver um além

O desejo de ser desta era

Já me torna ultrapassado, aquém 

A adversidade recupera

As virtudes que a prosperidade deixa sem.


O presente é o paladar atual 

O passado é um pão bolorento 

O futuro é utopicamente factual

A saudade é um apartamento 

Na verdade, é uma casa com quintal.



 

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