terça-feira, 2 de dezembro de 2025

Vestígios de Niterói



Nas curvas do MAC, o céu se inclina,

Espelhando um póstumo que já se desfaz,

O concreto persiste, mas o clima ensina

Que até o contemporâneo se curva à paz


As águas da Baía, outrora calmas,

Trazem marés que não sabem recuar,

E o Forte de Santa Cruz, entre lágrimas,

Observa o sal corroer seu olhar secular


No Morro do Palácio, o samba ecoava,

Voz de um povo, lembrança em canto,

Porém a chuva, que antes abençoava,

Desce em forma de estrago e pranto


As trilhas do Parque da Cidade

Perdem mais verde a cada voraz verão

E o mico-leão, guardião da amizade,

Busca asilo onde há desproteção


A canoa caiçara, saber ancestral,

Desaparece com o mangue

E o pescador, herdeiro do litoral,

Vê sua cultura submersa e estanque


Entre o mar e a memória, Niterói padece,

O tempo virou vilão, não é mais herói,

As águas sobem e os ventos desobedecem

Ao passado que suavemente se destrói


Na Ilha da Boa Viagem, o silêncio ecoa

Onde era encontro de festas e fé

Agora as pedras se partem à toa,

E os torós não deixam os altares de pé


Museus e praças, antigamente abrigos,

Sofrem com o calor inclemente

E as árvores caídas, em seus vestígios,

Contam biografias que o clima não desmente


Contudo há quem resista, quem registre,

Com câmeras, pincéis e palavras

Imagens e versos que ainda insistem

Em preservar o que o tempo lavra


Niterói, cristal de recordação e arte,

Grita por cuidado, por resguardo,

Pois cada grão, lugar e resgate

É raiz viva do nosso legado.

quinta-feira, 27 de novembro de 2025

Algumas obras de arte



Salvam o circo

Da fome, do mofo e do declínio 

Algumas obras de arte

Porém nem todas são capazes

 

O desejo do desejo

É a morte personificada

As ideias perdem o desenho 

Na aldeia erma das palavras

 

E você me comenta que faz sol

Que cairá um toró ou que venta demais

Ao lhe perguntar como está 

Como você vai? Está melhor?


Talvez seja uma metáfora 

O estado pluvial ou solar

Vinte e cinco limões secos não transbordam

Um copo de suco à beira do mar


Algumas obras de arte

São mais do que boas redentoras

Algumas só, nem todas

São reais boias de resgate


O sonho toma forma

Quando se acorda 

O conhecimento soma na vivência 

O saber é sentido no sabor


O cotidiano vira cinema

O sentido sobrevive no amor

O sonho se transforma

Com determinadas obras

 

Uma mensagem divina

Mesada da viagem

Chamada da vida

Chama da coragem


Vivendo o momento 

O futuro será estupendo

Fariam falta ao mundo, à vila

Algumas obras de arte


Poupam o indivíduo 

Da solidão, da lassidão e do suicídio 

Algumas obras de arte

Poucas possuem tal capacidade


As ideias não são aproveitadas

Na privação das palavras

O vento prepara o penteado 

No passeio da orla


O sonho é concretizado

Quando se acorda

Poemas, danças, canções, quadros,

Peças e arquiteturas sempre agora


Vivendo o instante 

O futuro será brilhante

O sonho é descoberto 

Quando a lembrança colabora


O anseio do anseio

É o falecimento em pessoa 

Ns orla, o vento orna o passeio

Falando que hoje não tem garoa


Na quietude eu me reconecto

Com o meu espírito e confio

Na atitude invisível 

No caminho aberto


O sol nascente bate

Na cara de quem sente e olha 

O sonho é uma obra

Uma sobra da realidade















terça-feira, 18 de novembro de 2025

Garrancho beletrista

 



Garrancho beletrista

Guerra serena

Paz belicista

Qual é a senha?

Periferia elitista


Autoridade pequena

Papado niilista

Imprensa isenta

A gargalhada matutina 

Não tem efeito colateral


Não dá ressaca nem assassina

Tal felicidade não faz mal não 

É mais forte a minha luz interior

Porque, meu amor, a escuridão 

É uma velha vizinha do andar anterior 


A vida não é o seu drops predileto

Aprendizado a fórceps

Por meio de tentativas e erros

Correção do barômetro interno 

Leitura do mundo como um código


O futuro não será um bar no inferno

Se for um prédio de fé e propósito

O passado, pois é, já está curado

Vai um presente expresso de modo 

Autêntico? É sem compromisso!


Se os aplicativos precisam tanto

De atualização a cada momento 

Nós também precisamos 

Noites fugidias, dias nojentos

Muito tempo gasto a gosto sumindo


Longe de mim, mesmo aqui

Foi longa a noite no labirinto 

Não sei, minto, sei como dormi

Agora é um novíssimo quadro

Deste clube sou sócio-membro

 

O futuro mora nas nuvens, ao lado,

O passado, bem me lembro, 

Já está mofado e acabado

E o presente não é desembrulhado

Somente em dezembro


Garrancho beletrista

Silêncio sônico

Paz belicista

Qual é o sonho?

Poesia astrologística


Não escrevo na areia

Nem grafo no ar

Para que se leia

Ligeireza gravada devagar

Qual é a lenha?














sábado, 8 de novembro de 2025

Gole de ar

 



Gole de ar, meu anjo

Me ajuda pelo encanto

Vem a galope me ajudar

Não finge que quer se calçar


Enquanto me fisga feliz

Junto com os planos gentis

Meu anjo não pode se cansar 

Na rede, na rua, golpe haverá


Agora gosto de mim

Aprendi realmente a gostar

De cuidar do jardim

Talvez goste cada vez mais


Gole de ar, gole do gol

Gole do grito a degolar

Gole do diletante meio de ser quem sou

O grande segredo da mente


Se eu nasci descalço 

Sem gravata nem parênteses 

Eu renasço e, grato, me refaço 

Alvorada vasta e perene


Gole de suor, do que há 

De melhor, nem sempre

Meu anjo vem cá me salvar

Sabendo que sou eu somente


Para me deixar de um jeito

Impecavelmente imperfeito

Meu anjo não foge do que é sério 

Nem deixa que eu me afogue


Neste chão, oceano aéreo

Não quer que me sufoque

De insanos mistérios

Anjo, amor, minério forte


Meu plano, canto protetor

Planando por onde for

O sonho que quero tanto

No playground, em pleno voo


O plantão parece o mar

No balde sereno, manso

E também malemolente demais

Nas estrelas, futuro de antanho 


Se eu nasci inseguro e alucinado

Numa noite nada quente de junho 

Eu me redireciono e nado 

Em ondas de arte, meu sonho justo.












quarta-feira, 29 de outubro de 2025

Mensageiro do indizível

 




Mensageiro do indizível
Entrego gestos e poemas
Escritos em correspondências
Comunicação com espíritos
Frequento muros e cinemas

Jardineiro do deserto
Cultivo menos incêndios
No solo, eu me refloresto
A solidão é um prêmio
E a solidez, um prédio.

A versão presente
É a melhor edição de mim
Sonho, suor, semente
Que emana do verão do porvir
Semana que vem de repente

Calma diserta
Escuridão que sempre vi
Pausa maior do que a conversa
Canção que toca por aí
Na calada discoteca

Semeio versos e pensamentos
Floricultor no meio da aridez
Viro árvore de milênio
Visitada mês após mês
A solução do silêncio

Sentença reticente
Telepatia que sempre entendi
Olhar eloquente
Relato do que não se diz
Estalo que pinta de repente.

quinta-feira, 9 de outubro de 2025

Coragem e carinho

 



Não é ideologia 

Mas um tipo de seita

Perfeita lobotomia

Loucura à espreita

História ao vivo todo dia


O paraíso se povoa

De intenções nada boas

O olimpo é a moradia

De bênçãos, besteiras

Utopias e armadilhas 


À margem, no caminho 

Com a bússola interior 

Coragem e carinho

Não soube mais ser inferior

Luz, baque, saída, bom dia 


Descoberta do cadinho 

Cuja substância eu sou

Coragem e carinho 

Do embaçamento sobe o esplendor

E se vê o que não se via


Pleno, eu não me sinto vazio

Lendo, viajo lindo por aí 

Coragem e carinho 

Consigo me digerir e dirigir

A vida é uma película, um livro 


Não se trata de política 

Mas de politicagem 

Espectros de uma antiga

Programação da mesma grade

Está gravando? Tudo se grita!


Descoberta do caminho 

Cuja alternância eu sou

Coragem e carinho 

Da desconfiança sairá o que for

A ancoragem é minha.







domingo, 21 de setembro de 2025

O motivo e o motor


 



Já existem o motivo
E o motor do veículo
Eu moro no volante
Não ando mais claudicante

Uso o santo de segurança
O sentido ousa na dança
Dos dias e das cadeiras
Parecia brincadeira

Eu comecei por lazer
Para deixar de ser criança
E parei de beber pra me zelar
Pra não ser mais um bebê

Já resistem o motim
E o mote dentro de mim
Estou firme aqui neste instante
Não mofo mais tão distante

Sem relógio tampouco hora
Mas não me importo, tenho tempo
Rogo para abrir logo a porta
Para o grande momento

Já há o grito do motor
E o motivo da trama, do tremor
Uma parte de mim vive na estante
Não chafurda na lâmina dando vexame

Ganhei algumas chaves nestes anos
E me livrei de quilos
De danos em pensamentos levianos
Agora é um passatempo tranquilo

Há quem siga tanto um modelo
A ponto de querer mordê-lo
Eu comecei por prazer
Para ingressar no mundo adulto

E desisti de me deter
Para sair do labirinto escuro
Laboriosamente brilham
O motivo e o motor no indivíduo

Eu não entendia em tempos idos
Porque enjoava ou me entediava
No entanto hoje em dia, pelo amor,
As ilusões rangem às claras

A mente se arranja na trilha
Da montanha onde sou
Mais do que ilha, península,
O motivo e o motor.